desconstruindo um tradutor universal
por Fagon Jinn
9º da série FC vs Ciência
9º da série FC vs Ciência
Cena de Flash Gordon (1936) |
Quando Flash Gordon chega a Mongo, ele descobre que o Imperador Ming e todo o seu império fala...
...Inglês?!!?
Como assim?...
Ming tem uma aparência asiática. Não devia ele falar... cantonês...? Mandarim...? Mongol? Sei lá! ...mas ...inglês!?
Estabelecemos aí a confirmação de um precedente terrível. Não começou com Flash Gordon mas, com certeza, se definiu com ele.
2001: Uma Odisséia no Espaço (1968) |
Não seria mais sensato se o personagem tivesse dificuldades para entender a língua alienígena? Então eles passariam um período fazendo 'macaquices' para se comunicar e aos poucos iam estabelecendo um vocabulário sonoro e gestual. E a comunicação surgiria.
Faz sentido..., mas quebra-se a fluência do roteiro. O fato é que roteristas, escritores e diretores não têm criatividade suficiente para superarem este dilema.
Jornada nas Estrelas, nos anos 60 apresentou uma criativa solução para esta problemática:
Cena do episódio Metamorfose |
-...o incrível Tradutor Universal!!!
Mas, o que vem a ser isso?
Em '67, em sua segunda temporada, Jornada surge com este conceito. E eles explicam que o aparelho poderia traduzir as ondas emitidas pela mente alienígena e então produzir palavras na linguagem do outro interlocutor e vice versa. Diria que eles tinham um aparelho telepático, já que se fazia uma leitura mental.
Prop original da série |
Nas séries spinoffs da Franquia, eles preferiram omitir qualquer tentativa de esclarecimento. Mas tem-se a impressão de que, baseado em técnicas de processamento de dados, o computador aprende a linguagem alheia, produz uma interpretação e a reproduz na língua da Federação. A questão é que isso deveria criar uma confusão sonora, já que a comunicação é multidirecional, com vários alienígenas falando ao mesmo tempo. Concluo que os usuários devem ter implantes auditivos que transmitem as traduções apenas para os seus ouvidos, de tudo aquilo que se fala no ambiente.
Qual seria a possibilidade de termos um equipamento que funcionasse dentro destes parâmetros?
Vamos falar de inglês – português. Se falo para um tradutor eletrônico, em português, para o meu amigo britânico que só entende inglês, a coisa funcionaria assim: eu falo; o equipamento do meu amigo capta; decodifica o meu som; interpreta com base num extenso banco de dados linguístico; traduz para o equivalente no inglês; codifica para sons; reproduz para um fone de ouvido, tentando imitar o meu timbre de voz.
No caso de termos mais de duas pessoas conversando e cada uma com sua própria língua, deveremos ter um sistema muito inteligente para separar os diferentes timbres de voz, e interpretar cada pessoa que participa da conversação.
O complicado é fazer um isolamento das vozes externas, sem isolar os sons externos, já que a minha voz ressoa pelo ambiente e, quem me escuta, ouvirá as vozes externas nas línguas originais, além das vozes traduzidas. Respeite a cacofonia. É preciso reter as vozes externas para não dificultar o entendimento, mas manter os outros sons, para que o usuário do tradutor não torne-se um surdo. É importante ouvir ruídos, alertas, músicas, etc.
Estamos vendo como isso é complicado e aparentemente impraticável. Mas pode piorar...
Mostrar a língua demonstra respeito |
Se eu quiser conversar com um nepalês. Sabe-se que em algumas das tribos nepalesas e tibetanas a linguagem é sonora e visual simultaneamente. Por exemplo, por a língua para fora e tocar com o indicador nela significa bom dia, se não estou enganado.
E aí? Como fica a tradução numa situação destas? Nestes casos o sistema deveria ter, também, câmeras para observar tanto o comportamento quanto as palavras.
C3P0 traduz inúmeras línguas e dialetos |
Ainda poderia ser realizável? Muito provavelmente. A criatividade humana para encontrar soluções absurdas, aparentemente, é inesgotável. Mas até então estamos lidando com um processo de linguagens desenvolvidas por humanos que, em muito, devem dizer coisas semelhantes com formatos diferentes.
Como poderíamos lidar com entendimento de comunicação entre nós e golfinhos? Nossas realidades são absolutamente diferentes. Golfinhos devem ter uma centena de sons para descrever o estado da água. Talvez eles vejam pássaros e frutas como seres semelhantes. Talvez um barco e uma baleia sejam uma mesma palavra em suas línguas. Cheiros podem transmitir informações, o exalar de aromas poderiam significar elogio, ou uma ofensa grave se, por exemplo, o aroma fosse um pouquinho mais almiscarado. O dobrar de uma barbatana de uma certa forma talvez signifique perigo. Um som emitido com uma inclinação corporal pode significar “obrigado pelos peixes”, uma inclinação de dois graus a mais talvez seja a resposta para a vida, o universo e tudo mais.
Aranhapolvo de Rama II - Arthur C. Clarke |
Não há como saber. Uma espécie pode se comunicar emitindo pulsos luminosos, outra com cusparadas na pele alheia, estas salivas podem conter feromônios que transmitem informações. E, para agravar, é necessário se ter um entendimento da sociologia destes seres para saber o que poderiam estar tentando informar.
Paródia de Marte Ataca (1996) |
Não acredito que o nosso primeiro contato com uma outra espécie inteligente do universo seja algo mais do que simplesmente olharmos para eles enquanto que eles nos cheiram. Rezaremos para que eles não interpretem nosso odor como algo agressivo. Deixaremos alguns artefatos com eles, tendo esperança de que eles não pensem que aquilo é uma ameaça. Talvez, com algumas décadas de estudos, possamos começar a entender como funciona sua matemática, e quais tipos de sentidos eles têm, quais são os possíveis métodos de comunicação. Talvez em cinquenta ou cem anos possamos passar para eles os cheiros de paz, vida e universo, com uma probabilidade menor de estarmos cometendo um erro grave.
Exploradores, espero que tenham se divertido e, quem sabe, compreendido algo, eu mesmo estou meio confuso.
No próximo artigo falaremos sobre armas.
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